Sonho do elefante
O elefante estava encostado a um canhoeiro e todo o seu ar exprimia satisfação.
Via-se a correr até ao lago, a ganhar balanço, a sentir a força da gravidade a ceder…e, depois, a planar sobre o lago. A gravidade não se tinha dissolvido, é certo, mas apesar de algumas aflições, ele conseguia controlá-la. A partir do meio da travessia, sentia-a a aumentar, lentamente, dando-lhe tempo para aterrar no lado de lá.
E recomeçava,
novo balanço, novo esforço para controlar a gravidade,
nova travessia planando sobre a água, até aterrar, sem choque, na margem oposta.
Outro elefante, a afastar-se do seu modo solitário, encontrou-o e quis saber a causa da sua satisfação.
O elefante respondeu, com detalhe, ao recém-chegado. Este, embora sentisse que, o agora companheiro, não funcionava bem da cabeça, tentou ver-se a fazer o mesmo.
Por vezes, a gravidade puxava-o demais, outras, libertava-o demais…mas com alguns sustos, viu-se a chegar à outra margem.
E, claro, quis repetir.
– Obrigada, amigo, eu andava perturbado porque me via a cair numa cova escura e profunda, a andar às voltas, preso a uma força estranha. Já receava ficar preso, às voltas, pela eternidade.
– Isso foi num outro tempo – respondeu o, agora, companheiro. Tens de mandar esse pesadelo para o passado.
– Tens razão, é um pesadelo e puxa-me para ontem… já o teu sonho…ficou em silêncio…
O outro falou – seria bom que me levasse para amanhã.
O sol do poente já se refletia sobre a água.
Os dois elefantes ficaram calados a olhar a superfície quieta do lago. Ambos tentavam definir o hoje.