A caixa

           

A caixa era forte, escura e pesada.

Ninguém sabia o que havia dentro. Um mais corajoso encostou o ouvido. Sentiu movimentos. Afastou-se amedrontado.

São cobras escuras – eu consigo ver através da parede da caixa.

– Vira essa boca para lá – alguém berrou.

A mulher da visão conteve-se; mas a pulsação apressara. A qualquer momento a tampa poderia ceder e os indesejáveis ocupantes saírem e espalharem a confusão pela praça.

– Vou pôr-me a salvo – informou um rapaz quase criança. E subiu a escadaria que dava para a entrada da sua habitação.

Os outros permaneciam atentos ao menor movimento. Quando a tampa pareceu mover-se, tomaram uma posição de fuga.

Mas a tampa voltou à posição inicial.

A calma voltou, mas percebia-se alguma desilusão.

– A tampa está a mexer, vejam! Vejam!

– Ouçam, ouçam! – ver não se vê nada – troçou outro.

A caixa permanecia misteriosa e insistente no meio da praça.

– Como veio aqui parar?

– Veio do passado. Parou aí porque não podia avançar mais.

Um vento ligeiro rodopiou, espantou alguns – tudo estivera quieto até então – agradou a outros que sentiam o calor do nervosismo.

Alguns dispunham-se a regressar a casa – era um assunto para as autoridades resolverem – mas, a um estremeção mais forte, a tampa elevou-se um pouco e apareceu a ponta do que parecia ser um bico.

Os olhares concentrados viram a tampa fechar de novo.

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( a narrativa completa faz parte de “Entre ontem e amanhã” pag. 145) .