azul/laranja

Os excertos que vou integrar nesta publicação, são retirados, com alterações mínimas, de Azul-laranja – um livro escrito por mim, há muito tempo, mas que não foi publicado.

“Ficara a olhar a manhã já alta, a prever o curso do sol e a pensar numa sequência para o seu livro, quando, para além da manhã, dos contornos das montanhas e das árvores, surgiu uma bola imperfeita mas já animada de um movimento quase regular, Sílvia abriu a boca de espanto – mas já?- quantos milhares de anos passaram?…

Ela ficou a ver o movimento da grande bola da qual, às vezes, se desprendiam pedaços que se espalhavam pelo espaço…

A conversa com o sr. Mário deixara um ruído de fundo quase impercetível, mas que viria a manifestar-se de forma bem audível enquanto Sílvia mexia uns ovos para o almoço. Atirou com o garfo e gritou – é isso! o interior da bola vai incendiar-se…

Sentou-se à mesa da sala e, sem dar conta do que fazia, pegou numa laranja e pô-la a andar à volta do seu eixo central e, depois, à volta na mesa – estou a ficar apanhada pelos movimentos circulares – à pressa, pegou na faca, descascou a laranja e comeu-a antes que ela virasse uma bola transparente presa a uma qualquer órbita…

O que se seguirá? – vai ficar a rodar pela eternidade fora? Mas alguma coisa mudava – na superfície da bola abriam-se golpes profundos. Ela arrepiou-se e ficou mais encolhida na cadeira – gotículas de energia, milhares de gotículas libertavam-se dos golpes abertos e espalhavam-se no espaço como se fossem lançadas pelo movimento circular.

Sílvia não deixou de pensar no gesto largo de um semeador, espalhando a semente na terra…

…ou o semeador vinha depois?

Perdera a noção do devir temporal. O depois era antes e aquele espaço bem definido, pontuado pela casa, pela aldeia, havia-se tornado um espaço sem referências no qual um grande movimento circular se havia organizado e dado ordem ao início.”

As imagens que parecem sugerir o começo ( ou começos – poderá não ter sido, apenas, um) referem movimentos circulares (turbilhões) espirais, cores escuras, formas côncavas, fraturas, pedregulhos a embater contra alguma coisa, terra sem consistência.

O sentimento que fica é tristeza (depressão), medo intenso (fora da escala do que deveria ser o nosso contexto) e, por vezes, desejo de destruição.

Criar imagens de sentido contrário, visualizá-las de forma repetida ou demorada será uma forma de ajudar a repor o equilíbrio. Adormecer com uma imagem positiva será sempre de grande ajuda.

Cada um, porém, poderá criar as suas estratégias.

No livro “Entre ontem e amanhã” há uma pequena narrativa que poderá ser inspiradora (Encher, triste)

Nota: o azul e o laranja são cores complementares.