Mito, começo.2

Nos contos tradicionais encontramos, com frequência, histórias a que associamos imagens (às vezes assustadoras) que terão a sua base em memórias remotas. São sentidos obscuros que persistem em continuar e continuarão se nós não os integrarmos no contexto próprio e aclararmos o seu sentido.

Nos mitos de criação aparecem monstros medonhos que os deuses ou os homens terão de abater para construir o mundo.

Mircea Eliade em “O sagrado e o profano” fala sobre isso com exemplos vários.

A que correspondem estes monstros – que memórias evocam?

Também na literatura há narrativas que bebem nestes monstros. Repetem-se, repetem-se, com pequenas alterações pontuais, mas mantêm o essencial de um mesmo sentido.

Parece que o que deveria ser tomado em sentido figurado permanece preso a um sentido real fora do nosso contexto.

Sacrifícios sangrentos por vezes com vítimas humanas, torturas… é toda uma área de sentidos obscuros.

Mas há mitos que se fixam noutros aspetos.

“A crença ocidental num Deus e num homem criadores trouxe consigo a noção de que a natureza deve ser dominada. Porém, os japoneses, por exemplo, não tendo um deus criador nem um mito da criação como o ocidental, enveredaram por outra via e aliaram-se à natureza. O seu mundo, como o de Hesíodo, resulta da procriação. As divindades masculina e feminina, Izanagi e Izanami, de pé na ponte flutuante do céu, atiraram a preciosa lança celeste para o mar que havia em baixo. No lugar onde a lança se espetou a água coagulou numa ilha, onde ambos dormiram juntos”.

(de: Os Criadores de Daniel J. Boorstine) 

Imagens de massas negras enroladas ou sujeitas ao movimento de um vórtice são frequentes em imagens de contexto de começo. Aliás, o movimento da cobra e a forma da cobra são omnipresentes.

Poderão não se referir a cobras reais; mas são representações que permanecem.

Na pintura contemporânea aparecem as telas matéricas de cores escuras, ou monocromáticas que parecem evocar imagens primordiais.

Também na escultura são frequentes as formas antropomórficas, as formas ambíguas que parecem resultar do cruzamento de formas várias. Aparecem a questionar as formas já definidas do nosso contexto.